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Mulheres e mundo do trabalho

Anelisa Maradei
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Mulheres e mundo do trabalho

Tenho muito orgulho da minha história. Aos 28 anos, me divorciei e já tinha dois filhos. Considero que tive uma trajetória como mulher, mãe, executiva e empreendedora de muito sucesso. Eduquei meus meninos e profissionalmente passei por grandes agências na minha área de atuação, onde tive oportunidade de atender clientes como Submarino, Associação Brasileira de Supermercados etc. Fui executiva na Perdigão. Fundei a a.maradei comunicação, em 2001. Coordenei muita gente boa e que me ajudou a construir a história de sucesso da empresa, a conquistar clientes importantes, como Rede Giraffas, Novo Nordisk, Farmacêutica Valeant, Leucotron Telecom, Cipatex e tantos outros, mas, acima de tudo, a me tornar uma pessoa muito melhor.

Fui para a carreira acadêmica, um sonho que realizei tardiamente, depois de cursar mestrado e doutorado. No doutorado, pude viver fora do país, aos 50 anos de idade, como uma jovem estudante mochilando pela Europa. Quem diria.... Fiz muitos amigos nesses 54 anos. Viajei, dancei, gargalhei, amei, sofri, sobrevivi. Mas, por mais que sinta que eu tenha tido êxito, acho que sou uma exceção, pelos meus esforços, é fato, e pelas oportunidades que a vida me deu.

Durante a Pandemia, ouvindo uma live sobre as ações de executivos líderes, pude notar que, de quatro participantes do evento, três eram homens e havia apenas uma mulher CEO. Interrogados pelo mediador sobre o motivo de termos tão poucas mulheres à frente das organizações, veio a triste constatação, confirmada pelos líderes do Itaú e da Ambev: essa é mesmo uma realidade nas organizações. O CEO da Ambev, Jean Jereissati, ao discorrer sobre a questão em sua empresa, relatou que as condições de entrada são similares, mas que as mulheres vão ficando pelo caminho pelas demandas dos cargos de liderança (troca de países, viagens, carga horária etc.) versus a realidade feminina na nossa sociedade. Essa realidade endureceu ainda mais durante a Pandemia, com aumento das atribuições domésticas e, para muitas de nós, o desemprego e a decorrente informalidade no mundo do trabalho.

Ainda temos uma sociedade machista, que deixa para o sexo feminino o papel de cuidar da educação dos filhos e das múltiplas e invisíveis tarefas domésticas, em detrimento da possibilidade de ascender profissionalmente. Alguns dirão que a vida é assim, e que se dedicar aos filhos é maravilhoso, o que eu concordo plenamente. Mas, aqui, o que coloco em discussão não é essa perspectiva. Trato de maior compartilhamento de responsabilidades e de oportunidades para a mulher dentro das relações, além de mais condições efetivas para o sexo feminino nas empresas. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres são 45% da população economicamente ativa no Brasil. Ressalto, entretanto, que, de acordo com o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), apenas 7,2% dos membros dos conselhos são mulheres. Em relação aos cargos de liderança nas empresas, as desigualdades persistem, e, de acordo com o Ministério da Economia, as mulheres detêm 13,9% de posições em nível de diretoria.

Em contrapartida, de acordo com relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da ONU, realizado em 70 países, ter mulheres em cargos de liderança é um dos fatores que contribui para maior desempenho e lucratividade nas empresas em geral. O estudo aponta que 75% das empresas que optaram por escolher mulheres para cargos gerenciais tiveram aumento considerável nos lucros, cerca de 5 a 20%. Por isso, acho pertinente abordarmos o tema. Ser mãe é maravilhoso e um presente divino. Mas tive a sorte de ter transposto obstáculos, e, ainda jovem, como chefe de família que fui, consegui seguir minha carreira, qualificação profissional, o que me deu as possibilidades que tive e os horizontes que ainda tenho.

Penso que todos os cidadãos, as empresas precisam refletir e trazer cada vez mais ao debate a pauta da mulher dentro das organizações. Da mulher mãe, da mulher que envelhece. Tenho 54 anos e vejo inúmeras profissionais da minha área sendo descartadas pelas empresas por uma única razão: estão caras demais, competentes demais e podem ser substituídas.

Byung-Chul Han (2012) é um autor que trata da diferença entre transparência e verdade. Transparência, segundo ele, é relativa à positividade, ou seja, significa reforçar a boa imagem da organização, no caso, o que ela está fazendo pelas mulheres, reforçar narrativas positivas, como muitas organizações estão fazendo nos últimos anos. Mas a verdade é a negatividade. É questionar tudo aquilo que não é percebido como positivo, é problematização, é ir além de informar e se propor a mostrar o quanto ainda temos por fazer e o quanto estamos distantes da igualdade que buscamos e desejamos. Espero que as narrativas das organizações não sejam limitadas ao discurso, mas efetivamente incluídas nos propósitos das empresas como ações. Aqui na a.maradei comunicação somos um time bastante feminino, de guerreiras que têm o direito da mulher como bandeira.

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